sábado, 30 de abril de 2011

PEDAGOGIA WALDORF

1. Introdução
Valdemar W. Setzer.
Não há, basicamente, em nenhum nível, uma educação que não seja a auto-educação. [...] Toda educação é auto-educação e nós, como professores e educadores, somos, em realidade, apenas o ambiente da criança educando-se a si própria. Devemos criar o mais propício ambiente para que a criança eduque-se junto a nós, da maneira como ela precisa educar-se por meio de seu destino interior.

Rudolf Steiner, A Prática Pedagogócia (São Paulo: Ed. Antroposófica), palestra de 20/4/1923, GA 306


A Pedagogia Waldorf foi introduzida por Rudolf Steiner em 1919, em Stuttgart, Alemanha, inicialmente em de uma escola para os filhos dos operários da fábrica de cigarros Waldorf-Astória (daí seu nome), a pedido deles. Distinguindo-se desde o início por ideais e métodos pedagógicos até hoje revolucionários, ela cresceu continuamente, com interrupção durante a 2a. guerra mundial, e proibição no leste europeu até o fim dos regimes comunistas. Hoje conta com mais de 1.000 escolas no mundo inteiro (aí excluídos os jardins de infância Waldorf isolados).
As escolas Waldorf sempre foram integradas da 1a à 8a (ou 9a) séries, e até a 12a quando possuem o ensino médio, de 4 anos. Não há repetições de ano, e nem atribuição de notas no sentido usual.
Uma das principais características da Pedagogia Waldorf é o seu embasamento na concepção de desenvolvimento do ser humano introduzida por Rudolf Steiner .Essa concepção leva em conta as diferentes características das crianças e adolescentes segundo sua idade aproximada. O ensino é dado de acordo com essas características: um mesmo assunto nunca é dado da mesma maneira em idades diferentes.
Ela é uma pedagogia holística em um dos mais amplos sentidos que se pode dar a essa palavra quando aplicada ao ser humano e à sua educação. De fato, ele é encarado do ponto de vista físico, anímico e espiritual, e o desabrochar progressivo desses três constituintes de sua organização é abordado diretamente na pedagogia. Assim, por exemplo, cultiva-se o querer (agir) através da atividade corpórea dos alunos em praticamente quase todas as aulas; o sentir é incentivado por meio de abordagem artística constante em todas as matérias, além de atividades artísticas e artesanais, específicas para cada idade; o pensar vai sendo cultivado paulatinamente desde a imaginação dos contos, lendas e mitos no início da escolaridade, até o pensar abstrato rigorosamente científico no ensino médio. O fato de não se exigir ou cultivar um pensar abstrato, intelectual, muito cedo é uma das características marcantes da pedagogia Waldorf em relação a outros métodos de ensino. Assim, não é recomendado que as crianças aprendam a ler antes de entrar na 1a série. Sobre a necessidade do brincar infantil no jardim-de-infancia, veja-se o artigo "Crisis in the Kindergarten: why Children Need to Play in School" editado pela Alliance for Childhood. Para as caracterizações sucintas do desenvolvimento infantil e juvenil em períodos de 7 anos, os setênios, base fundamental da pedagogia, vejam-se os artigos de Sonia Setzer sobre educação e drogas e o de Sonia Ruella. Como o computador força um pensamento lógico-simbólico, nenhuma escola Waldorf digna desse nome utiliza essa máquina, sob qualquer forma, antes do ensino médio (9a série na seriação Waldorf); ver artigos a respeito.
As escolas Waldorf são totalmente livres do ponto de vista pedagógico, pertencendo em geral a uma associação beneficente sem fins lucrativos. Idealmente, a administração escolar é feita pelos próprios professores .Cada escola é independente da outra: o único que as une é o ideal de concretizar e aperfeiçoar a pedagogia de R.Steiner, visando formar futuros adultos livres, com pensamento individual e criativo, com sensibilidade artística, social e para a natureza, bem como com energia para buscar livremente seus objetivos e cumprir os seus impulsos de realização em sua vida futura. O amor que os professores Waldorf devem desenvolver pelos seus alunos, e o conhecimento profundo que eles adquirem de cada aluno são outras características fundamentais da pedagogia. Por exemplo, idealmente durante os 8 anos do ensino fundamental cada classe tem um único professor que dá todas as matérias principais, isto é, fora artes, artesanato, educação física e línguas estrangeiras (em geral duas, nos 12 anos de escolaridade). No ensino médio há um professor que, durante os 4 anos, assume o papel de tutor da classe. O médico escolar tem nas escolas Waldorf um papel fundamental de apoio médico-pedagógico aos professores, e deve conhecer profundamente a pedagogia.
Nos Estados Unidos, as melhores universidades costumam aceitar com preferência os ex-alunos Waldorf, pois sabem que se trata de jovens diferenciados, com uma vasta cultura, com capacidade de concentração e aprendizado, e alta criatividade. Nesse país, que tanto se caracteriza pela praticidade de seu povo e pela liberdade de ensino, houve nos últimos 30 anos uma explosão de escolas Waldorf, que passam hoje em dia de uma centena.
No Brasil há 25 escolas Waldorf ou de inspiração Waldorf (sem contar jardins de infância isolados), sendo 4 em S.Paulo (3 com ensino médio). A mais antiga, existente desde 1956, é a Escola Waldorf Rudolf Steiner de São Paulo, que tem cerca de 850 alunos e 75 professores. Agregado a ela há o curso mais antigo de formação de professores Waldorf no Brasil, reconhecido oficialmente. Em 2010, segundo o site da Federação das Escolas Waldorf no Brasil, há um total de 73 escolas Waldorf reconhecidas por ela, com 2050 professores e 2500 alunos de jardim de infância, 4180 alunos no ensino fundamental, 580 no ensino médio.

No Brasil, espera-se que os formados no ensino médio ainda façam um semestre ou um ano de cursinho para entrar nos cursos superiores mais concorridos, se bem que tem havido muitos casos de aprovação no vestibular nas melhores universidades, sem cursinho. Em geral, os ex-alunos entram em faculdades de procura média sem necessidade de preparo adicional. 2. Publicações, artigos e vídeos

Há muita literatura sobre pedagogia Waldorf em português, principalmente publicada pela Editora Antroposófica e pela Federação das Escolas Waldorf no Brasil.

O currículo Waldorf de E.A. Karl Stockmeyer

Veja, o primeiro sistematizado sobre a pedagogia Waldorf, traduzido do livro de E.A.K. Stockmeyer Rudolf Steiners Lehrplan für die Waldorfschule (O currículo de Rudolf Steiner para as escolas Waldorf), 2ª edição apostilada de 1965; a primeira edição datou de 1955.

Livros especialmente recomendados

  1. Rudolf Lanz. A Pedagogia Waldorf – Caminho para um Ensino mais Humano, 6ª ed., S.Paulo: Ed. Antroposófica 1998.
  2. Leonor von Osterroht. Da Manhã ao Anoitecer – jardim de infância cantando e brincando. Botucatu: Editora Diagrama, 2008. Trata-se de livro, fruto de 25 anos da autora como professora de jardim de infância Waldorf, com canções infantis, inclusive muitas alemãs traduzidas especialmente pela autora; estas últimas são especialmente recomendadas pela sua singeleza e adequação a crianças pequenas (nada de "Atirei um pau no gato-to", "O cravo brigou com a rosa" etc.). O volume contém as letras e as pautas musicais das canções e um CD com 49 delas gravadas pela autora acompanhada de violão, o que permite que professores de jardins de infância e pais possam aprendê-las mesmo sem conhecer notas musicais. O livro está à disposição na loja da Editora Antroposófica e também diretamente com a autora, tel. (14) 3882-3649. Cantar constantemente com crianças é parte essencial da educação Waldorf. A propósito, na contra-capa do livro lê-se: "Nota da autora: O CD com as músicas que acompanha esse livro é destinado aos educadores. Recomendamos não tocá-lo para as crianças. Nada como a criança ouvir pela voz da professora." Ouça uma das canções do volume (formato wma, 362 kB).

Artigos e textos

  1. Artigo "A educação pode contribuir na prevenção do consumo de drogas?" da médica antroposófica Sonia A.L. Setzer, que durante 28 anos foi médica escolar da Escola Waldorf Rudolf Seiner de São Paulo.
  2. Vários ensaios e artigos de Valdemar W. Setzer em português, espanhol, inglês e alemão inspirados na pedagogia Waldorf, tratando de problemas de uso de computadores na educação, joguinhos eletrônicos, televisão, tecnologia, considerações contra o aprendizado precoce de leitura, computadores e arte, ciência e espiritualidade, etc., e um relato de um curso ("época", no jargão Waldorf) sobre a lenda de Parsifal ministrado por Sonia A.L. Setzer para um 11o. ano da Escola Waldorf Rudolf Steiner de São Paulo.
  3. Texto bilíngüe (português/alemão) com um folheto editado pela União das Escolas Waldorf sobre o problema da idade de escolarização.
  4. Artigo de Anderson Paulino de Souza, sobre a questão da disciplinado ponto de vista da Pedagogia Waldorf. Relato dele sobre uma interessante palestra que ele proferiu contra a alfabetização precoce para pais de um jardim de infância Waldorf em formação.
  5. Artigo de Sonia Ruella onde são descritos sucintamente os 3 primeiros setênios, divisão fundamental na pedagogia Waldorf, e como o professor deve atuar em cada um.
  6. Descrição de uma iniciativa de instalar jardins de infância Waldorf no Vietnam (em inglês).
  7. Artigo de Wanda Ribeiro (socióloga) e Juan Pablo (engenheiro e empresário), pais da Escola Waldorf Rudolf Steiner de São Paulo, relatando resultado de levantamento estatístico feito com ex-alunos dessa escola, a fim de desmistificar 7 mitos correntes sobre os resultados da Pedagoia Waldorf. Versão em inglês, estendida. Idem, com gráficos, publicada pelo Waldorf Researchers and Educators Network (WREN). Versão em alemão. Ver também o artigo 13 abaixo.
  8. Artigo de Valdemar W. Setzer comentando o capítulo "Rudolf Steiner 1861-1925" do livro de Joy A. Palmer 50 Grandes Educadores - de Confúcio a Dewey; esse artigo contém várias informações sobre Pedagogia Waldorf, Antroposofia e Rudolf Steiner.
  9. Artigo de Valdemar W. Setzer comentando o capítulo "Rudolf Steiner" do livro de Fritz März Grandes Educadores: Perfis de grandes educadores e pensadores pedagógicos.
  10. Texto humorístico "Você é Waldorf quando..." elaborado por participantes do GEA (Grupo de Ex-Alunos Waldorf).
  11. Artigo de Sonia Setzer "As peças natalinas de Oberufer". Essas peças são tradicionalmente representadas na época do Natal pelos professores de escolas Waldorf, para os alunos e pais, todos os anos, no mundo todo. São também representadas em outras instituições antroposóficas, como instituições para deficientes, clínicas, hospitais, fazendas biodinâmicas, etc.
  12. Artigo de Edward Miller and Joan Almon, "Crisis in the Kindergarten: why Children Need to Play in School" sobre a necessidade de crianças brincarem no jardim-de-infância, publicado pela Alliance for Childhood
  13. Artigo de Douglas Gerwin e David Mitchell, "Standing out without standing alone: profile of Waldorf School graduates", com várias tabelas com estatísticas mostrando o excelente desempenho dos formados em escolas Waldorf nos EUA. Ver também o artigo 7 acima.
  14. Artigo de Ana Gonzaga, "Rudolf Steiner: o defensor da sensibilidade – Aliando ensino e espiritualidade, o educador austríaco desenvolve a Pedagogia Waldorf" publicado na revista da Ed. Abril Nova Escola, ed. 228, dez. 2009, com comentários de V.W. Setzer inseridos no texto.
  15. Artigo de Valdemar W. Setzer "Meu filho está terminando o ensino fundamental Waldorf. E agora?" Alguns pais de alunos de escolas Waldorf planejam tirá-los dessas escolas para cursarem o ensino médio em uma escola tradicional; o artigo analisa possíveis razões para isso, mostrando a contrapartida da pedagogia Waldorf.
  16. Descrição do currículo Waldorf do ensino fundamental, ano a ano, em inglês, como ensinado por Eugene Schwartz, com detalhes dos conteúdos de cada "época" (as matérias principais são dadas pelo professor de classe – que acompanha a classe do 1º ao 8º ano) em períodos concentrados de 3 ou 4 semanas (recomendação de Rudolf Steiner; enquanto a criança ou jovem estudam a matéria principal durante uma "época", as outras matérias são trabalhadas e amadurecidas pelo inconsciente).
  17. Lista de muitos artigos de Eugene Schwartz, em inglês, descrevendo vários detalhes da pedagogia Waldorf.
  18. Artigo "Promovendo educação saudável" (em pdf com 1,8 MB), publicado no jornal A Tribuna, de Santos, SP, em 8/12/10, p. A6.
  19. Artigo "Sintonia com a natureza", 1ª página (em pdf, 500 kB), publicado em 21/11/10 em AT Revista Nº 312, do jornal A Tribuna, de Santos, SP. Veja também a 2ª página (755 kB) e a 3ª página (655 kB).
Nas páginas da Federação das Escolas Waldorf no Brasil  encontram-se muitos artigos sobre Pedadogia Waldorf.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

PEDAGOGIA, DIVERSIDADE E DIFERENÇA

A diversidade casa bem com a pedagogia, pois ambas compartilham a mesma esteira epistemológica. Ambas se propõem à administração do outro e conformam uma série de estratégias para operacionalizar esta finalidade. O fato é que  muito se fala sobre diferença, mas pouco sobre pedagogia. E muito menos sobre a viabilidade, a possibilidade de criação de uma pedagogia da diferença. Como há vários usos para a palavra diferença, pode-se dizer que cabe aqui uma distinção entre a pretensa pedagogia da diferença e a pedagogia da diversidade.
Segundo Foucault (apud VEIGA-NETO, 2005), a pedagogia foi criada para fazer valer o governamento das crianças a partir de um tronco comum. Entretanto, a diversidade celebra a pluralidade humana como manifestação natural na educação, tendo a tolerância como uma de suas máximas. Assim, a tolerância é um dos rótulos utilizados pela diversidade para efetuar o consentimento de aproximação da autoridade dos limites da norma. Desta forma, só que de uma maneira mais refinada, há uma normalidade como referência. Por isso, pedagogia e diversidade constituem um enlace possível. Tanto uma como a outra caminham juntas, utilizando a norma como uma espécie de maquinário.
Contudo, voltando à suposta pedagogia da diferença, é bom lembrar que a pedagogia, enquanto campo de saber, bem como a escola, enquanto instituição autorizada a efetuar este controle, não são locais de manifestação, muito menos de produção da diferença, mas de encapsulamento dessa diferença, havendo vários dispositivos como: o currículo, a metodologização, a avaliação. Sendo assim, a pedagogia só produz o efeito desejado, exercendo sua função, quando captura os sujeitos, ordenando-os, enquanto que a diferença só é diferença na fuga dessa ordem. Portanto, pedagogia e diferença só existem, para o que delas pretendem, na distância uma da outra. Elas não convivem, pois se processam em campos distintos.
Diante disso, pode-se até dizer que a diferença só é diferença onde a pedagogia não consegue atuar, ou seja, nas linhas de fuga, conforme afirma Deleuze (2004), ou seja, a diferença não é ‘pedagogizável’, sob pena de deixar de ser diferença. E a pedagogia, se deixar de ‘docilizar’ os indivíduos, é qualquer coisa, menos pedagogia. Surge aqui então um questionamento: seria mesmo possível uma pedagogia da diferença?
Acredita-se que a pedagogia da diferença seja, da mesma forma que a pedagogia da diversidade, uma vontade de saber, de familiarizar, de ‘desestranhar’ o estranho. No entanto, segundo Pierucci (1999), ela se traduz numa vontade de solucionar a questão a partir da instrumentalização metodológica, sendo essa mais uma cilada da diferença. A pedagogia da diferença, por melhor intencionada que seja, acaba aproximando-se  muito mais da noção de diversidade do que de diferença, o que atribui-lhe, uma expressão própria de  “pedagogia da diferença”, em si, o que parece ser paradoxal.
Nesse sentido, as faíscas referenciadas no início desse texto, não sejam as faíscas da diferença, mas sim as faíscas do discurso pedagógico, produzidas no duelo da pedagogia com a diferença, visto que ambas são forças discursivas que acabam sempre por embater-se, sendo o  discurso da pedagogia mais forte, uma vez que possui  um aparato de saber que o legitima.
Desse choque, lançam-se faíscas, fragmentos que reluzem, mas que logo se apagam, sendo essa a maneira como a pedagogia da diferença, muitas vezes acaba sendo compreendida: como um estilhaço de luz que, em sua provisoriedade, tentou, mas não deu conta de produzir uma chama que esclarecesse a penumbra que a diferença representa para todos os que lidam com a educação (educadores). O fato é que ainda existem aqueles que pensam de forma iluminista, literalmente. Diante disso, percebe-se a luta em querer-se colar um conceito pós-moderno (diferença) numa escola que foi criada para ser moderna.
Segue-se à procura da “luz”, da “verdade” sobre a diferença. Nesse ponto, volta-se ao lugar de sempre, ou seja,  na busca pelo descortinamento do mistério da diferença ou retorna-se ao início onde há o reencontro de cada um consigo mesmo, frustrados por não ter conseguido encontrar a resposta ou acreditando que encontrou esta verdade, capturando um outro que já não é outro, que é o mesmo, que é semelhante a todos. Nessa direção, torna-se necessário ressaltar o questionamento feito por Gallo (2005, p. 221): “podemos, professores que somos, deliberadamente escaparmos da vetorização metodológica da repetição, da identidade, para produzirmos alteridade, para produzirmos vetores de diferenciação?”
Que esse questionamento possa trazer aos leitores uma série de inquietações, levando-os ao quebrantamento de paradigmas, tendo em vista o crescimento que essa atitude pode trazer em benefício da implementação de uma ‘EDUCAÇÃO PARA TODOS’, que seja ‘INCLUSIVA’, atendendo ao seu objetivo principal: SER DEMOCRÁTICA e JUSTA.
Considerações finais, traços de possíveis recomeços
Desta forma, nessas divagações, sempre provisórias, deve-se continuar pensando sobre educação e diferença. Talvez possa-se usar outras estratégias para aproximar essas duas noções, com a implementação de outros deslocamentos a serem efetuados.
O primeiro a ser sugerido possivelmente, seja a própria noção de educação. Que a ‘Educação’ não seja reduzida à escolarização, não como sinônimo de pedagogia, não como uma educação maior, das políticas neoliberais, como afirma Gallo (2005), ao desterritorializar Deleuze. Mas que seja uma educação menor, do cotidiano, compreendida como educação para a aprendizagem, sendo algo incontrolável, que se processa nas brechas, tal como a diferença.
Para Gallo (2005,p.104), pode até haver métodos para ensinar (eles pelo menos servem para tranqüilizar as consciências perturbadas dos professores), mas não há métodos para aprender.
O fato é que o  método é uma máquina de controle, mas a aprendizagem está para além de qualquer controle; a aprendizagem escapa, sempre. O aprendizado não pode ser circunscrito nos limites de uma aula, da audição de uma conferência, da leitura de um livro; ele ultrapassa todas essas fronteiras, rasga os mapas e pode instaurar múltiplas possibilidades. Assim, segundo alguns autores como Bhabha(1998), Bauman (1999) e Deleuze (2004) , a experiência da aprendizagem e da diferença se dá nesses entre-lugares, interstícios espaços vazios, não-lugares, inter-ser, linhas de fuga. Estes são espaços de negociação das relações culturais, que não passam pelo crivo da norma, que não permitem regras, não sendo portanto,  passíveis de definição de um resultado ou resultados a priori, de sistematizações. Por isso, não podem ser pensadas sob o prisma da pedagogia e da diversidade, ou melhor, da pedagogia da diversidade.
A partir deste mergulho em lugares inseguros, pode-se pensar em educação, aprendizagem e diferença como experiências singulares, únicas e indomáveis. Quem sabe daí se possa pensar num casamento possível, não na tentativa de assimilar ou familiarizar o outro da educação, mas sim de “evitar a polaridade e emergir como os outros de nós mesmos” (BHABHA, 1998, p. 69).
Para tanto, acredita-se que outras faíscas possam ser lançadas, dentre elas: a desnaturalização dos processos de alterização dos sujeitos. Porém, não se trata simplesmente de conhecer o outro, como naquele pilar moderno que fala: “a falta de informação é a mãe do preconceito”. Não se trata de produzir a diferença como objeto de interesse e curiosidade, visto que isso já está sendo feito nos enunciados da diversidade.
O fato é que a informação em si não garante mudanças representacionais, pois conhecer a diferença sempre passa pelo olhar do mesmo, que simplesmente desloca o outro de lugar, mas continua numa confortável posição de normalidade. Por isso, sabe-se que é muito interessante efetuar a mudança de entender como se constroem os sistemas discursivos que produzem estas noções. Afinal, essa desnaturalização não opera somente na diferença, mas no olhar da mesmice.
Nesse sentido, talvez possa ser possível entender que  enquanto professores, como vetores de diferenciação, uma vez que exista o compromisso em  colocar em suspenso as verdades, mantendo-se longe de apontar um caminho milagroso, e consciente de que certas coisas possam ser inegociáveis, acredita-se que talvez, com isso, seja possível desestabilizar representações e dar vazão aos espaços vazios. Certamente, tais espaços não serão “permitidos”, senão seriam qualquer coisa, menos espaços vazios. Eles simplesmente surgem, como acontecimentos, como a própria noção de faísca.
Neste momento, até pode parecer algo fantasioso, dados os inúmeros procedimentos de regulação contemporâneos, mas como bem afirma Gallo (2005, p. 99):  “já houve momentos na história da humanidade em que parecia loucura lançar-se aos mares, em busca de terra firme para além do continente europeu, ou então se lançar ao espaço, almejando a Lua e as estrelas...”
Sendo assim, considera-se aqui que a busca pela verdade sobre a diferença, as formas de trabalho pedagógico com a diferença, uma pedagogia da diferença é um trajeto circular, um giro de 360°, que desemboca na mesmice. A tentativa de entendimento da diferença em sua dimensão política, histórica e cultural , acaba sendo  um labirinto com múltiplas possibilidades de trajeto e nenhuma saída segura. A pergunta agora é: quem está disposto a encarar esse DESAFIO de superar o labirinto em busca de uma saída, seja ela qual for?
Fica aqui a proposta de reflexão a todos os leitores e educadores interessados numa MUDANÇA ‘na’ e ‘para’ EDUCAÇÃO do século XXI, que buscam uma Pedagogia diferenciada, ou uma Pedagogia da Diferença, ou ainda, uma forma diferenciada de PEDAGOGIZAR!
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
BAUMAN, Z. O mal estar da pós-modernidade. Rio de janeiro: Zahar, 1999.
BHABHA, H. O local da cultura. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1998.
DELEUZE, G. & GUATTARI, F. Mil platôs: Capitalismo e esquizofrenia. Vol. I. São Paulo: Ed. 34. 2004.
GALLO, S. Sob o signo da diferença: em torno de uma educação para a singularidade. In: SILVEIRA, R. M. H. (Org.) Cultura, poder e educação: um debate sobre os estudos culturais. Canoas: Ed. ULBRA, 2005.
_______. Deleuze & a Educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2005.
PIERUCCI, A. F. Ciladas da diferença. São Paulo: Ed. 34, 1999.
Ms. LUCIENE MARTINS TANAKA

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Às adversidades

Já observou a atitude
dos pássaros ante às adversidades?
  
Ficam dias e dias fazendo seu ninho, recolhendo materiais, às vezes trazidos de locais distantes...
  
... E quando já ele está pronto e estão preparados para por os ovos, as inclemências do tempo ou a ação do ser humano ou de algum animal destrói o que com tanto esforço se conseguiu...
  
O que faz o pássaro?
Pára, abandona a tarefa?
De maneira nenhuma. Começa, uma outra vez, até que no ninho apareçam os primeiros ovos.
Muitas vezes, antes que nasçam os filhotes, um animal, uma criança, uma tormenta, volta a destruir o ninho, mas agora com seu precioso conteúdo...
  
Dói recomeçar do zero... Mas ainda assim o pássaro jamais emudece, nem retrocede, segue cantando e construindo, construindo e cantando...
  
Já sentiu que sua vida, seu trabalho, sua família, seus amigos não são o que você sonhou?
  
Tem vontade de dizer basta, não vale a pena o esforço, isto é demasiado para mim?
Você está cansado de recomeçar, do desgaste da luta diária, da confiança traída, das metas não alcançadas quando estava a ponto de conseguir?
  
Mesmo que a vida o golpeie mais uma vez, não se entregue nunca, faça uma oração, ponha sua esperança na frente e avance. Não se preocupe se na batalha seja ferido, é esperado que algo assim aconteça. Junte os pedaços de sua esperança, arme-a de novo e volte a ir em frente.
  
Não importa o que você passe...
Não desanime, siga adiante.
A vida é um desafio constante, mas vale a pena aceitá-lo. E sobretudo...
Nunca deixe de cantar.

terça-feira, 26 de abril de 2011

A RATOEIRA

Um rato, olhando pelo buraco na parede, vê o fazendeiro e sua esposa
abrindo um pacote.
    Pensou logo no tipo de comida que poderia haver ali.
    Ao descobrir que era uma ratoeira, ficou aterrorizado.
    Correu ao pátio da fazenda advertindo a todos:
    "- Há uma ratoeira na casa, uma ratoeira na casa!!! "
    A galinha, disse:
    "- Desculpe-me Sr. Rato, eu entendo que isso seja um grande problema para o senhor, mas não me prejudica em nada, não me incomoda."
    O rato foi até o porco e lhe disse:
    "- Há uma ratoeira na casa, uma ratoeira!!!"
    "- Desculpe-me Sr. Rato, disse o porco, mas não há nada que eu possa fazer, a não ser rezar. Fique tranqüilo que o senhor será lembrado nas minhas preces."
    O rato dirigiu-se então à vaca. Ela lhe disse:
    "- O que Sr. Rato? Uma ratoeira? Por acaso estou em perigo? Acho que não! "
    Então o rato voltou para a casa, cabisbaixo e abatido, para encarar a ratoeira do fazendeiro.
    Naquela noite ouviu-se um barulho, como o de uma ratoeira pegando sua
vítima. A mulher do fazendeiro correu para ver o que havia pego. No escuro, ela não viu que a ratoeira havia pego a cauda de uma cobra venenosa. E a cobra picou a mulher...
    O fazendeiro a levou imediatamente ao hospital. Ela voltou com febre.
    Todo mundo sabe que para alimentar alguém com febre, nada melhor que uma canja de galinha. O fazendeiro pegou seu cutelo e foi providenciar o ingrediente principal.
    Como a doença da mulher continuava, os amigos e vizinhos vieram visitá-la. Para alimentá-los o fazendeiro matou o porco. A mulher não melhorou e acabou morrendo. Muita gente veio para o funeral.
    O fazendeiro então sacrificou a vaca, para alimentar todo aquele povo.

    Na próxima vez que você ouvir dizer que alguém está diante de um problema e acreditar que o problema não lhe diz respeito, lembre-se que, quando há uma ratoeira na casa, toda a fazenda corre risco. O problema de um é problema de todos."


(desconheço o autor)

Inclusão Escolar: Um Desafio Entre o Ideal e o Real




“É preciso matar todos os dias os alunos ideais para que os reais sobrevivam!”



O presente artigo pretende provocar uma análise e reflexão a respeito das políticas de inclusão, levando em conta os paradigmas conceituais e princípios que vem sendo progressivamente defendidos em documentos nacionais e internacionais. A inclusão é um movimento mundial de luta das pessoas com deficiências e seus familiares na busca dos seus direitos e lugar na sociedade. Mas o que é de fato a inclusão? O que leva as pessoas a terem entendimentos e significados tão diferentes? Cabe aqui tecer algumas reflexões, pois dessa forma estaremos contribuindo para uma prática menos segregacionista e menos preconceituosa. O  termo”inclusivo" é usado quando se busca qualidade para todas as pessoas com ou sem deficiência. O fato é que a inclusão está respaldada na dialética inclusão/ exclusão, com a luta das minorias na defesa dos seus direitos.Para falar sobre inclusão escolar é preciso repensar o sentido que se está atribuindo à educação, além de atualizar nossas concepções e ressignificar o processo de construção de todo o indivíduo, compreendendo a complexidade e amplitude que envolve essa temática.
Na primeira Conferência da Rede Ibero-Americana de Organizações Não Governamentais de Pessoas com Deficiência e suas Famílias, reunida em Caracas, entre os dias 14 e 18 de outubro de 2002, considerando que é compromisso de todos elevar a qualidade de vida de pessoas com deficiência e suas famílias por meio de serviços de qualidade em saúde, educação, moradia e trabalho, declararam, 2004 como o ANO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA E SUAS FAMÍLlAS, almejando a vigência efetiva das Normas sobre a Equiparação de Oportunidades para Pessoas com Deficiências e o cumprimento dos acordos estabelecidos na Convenção Interamericana para Eliminação de todas as Formas de Discriminação Contra as Pessoas com Deficiência (Convenção da Guatemala­ 2001).O termo inclusão já trás implícito a idéia de exclusão, pois só é possível incluir alguém que já foi excluído..Também se faz necessário, uma mudança de paradigma dos sistemas educacionais onde se centra mais no aprendiz, levando em conta suas potencialidades e não apenas as disciplinas e resultados quantitativos, favorecendo uma pequena parcela dos alunos.
A idéia de uma sociedade inclusiva está fundamentada numa filosofia que reconhece e valoriza a diversidade, como característica inerente à constituição de qualquer sociedade. Partindo desse principio e tendo como horizonte o cenário ético dos Direitos Humanos, sinaliza a necessidade de se garantir o acesso e a participação de todos, a todas as oportunidades, independentemente das peculiaridades de cada individuo.O paradigma da inclusão vem ao longo dos anos, buscando a não exclusão escolar e propondo ações que garantam o acesso e permanência do aluno com deficiência no ensino regular. No entanto, o paradigma da segregação é forte e enraizado nas escolas e com todas as dificuldades e desafios a enfrentar, acabam por reforçar o desejo de mantê-los em espaços especializados.
Entretanto, a inclusão coloca inúmeros questionamentos aos professores e técnicos que atuam nessa área. Por isso é necessário avaliar a realidade e as controvertidas posições e opiniões sobre o termo. Outro aspecto a ser considerado é o papel do professor, pois é difícil repensar sobre o que estamos habituados a fazer, além do mais a escola está estruturada para trabalhar com a homogeneidade e nunca com a diversidade.A tendência é focar as deficiências dos nossos sistemas educacionais no desenvolvimento pleno da pessoa, onde se fala em fracasso escolar, no déficit de atenção na hiperatividade e nas deficiências onde o problema fica centrado na incompetência do aluno. Isso é cultura na escola, onde não se pensa como está se dando esse processo ensino-aprendizagem e qual o papel do professor no referido processo. Temos que refletir sobre a educação em geral para pensarmos em inclusão da pessoa com deficiência. É preciso lembrar que todos os alunos vêm com conhecimentos de realidade que não pode ser desconsiderado, pois faz parte de sua história de vida, exigindo uma forma diferenciada no sistema de aprendizagem.Mas temos que pensar que para que a inclusão se efetue, não basta estar garantido na legislação, mas demanda modificações profundas e importantes no sistema de ensino. Essas mudanças deverão levar em conta o contexto sócio.­econômico, além de serem gradativos, planejadas e contínuas para garantir uma educação de ótima qualidade (Bueno, 1998).
Portanto, a inclusão depende de mudança de valores da sociedade e a vivência de um novo paradigma que não se faz com simples recomendações técnicas, como se fossem receitas de bolo, mas com reflexões e ações dos professores, direções, pais, alunos e comunidade. Contudo essa questão não é tão simples, pois, devemos levar em conta as diferenças. Como colocar no mesmo espaço demandas tão diferentes e específicas se muitas vezes, nem a escola especial consegue dar conta desse atendimento de forma adequada, já que lá também temos demandas diferentes? Quando a educação inclusiva é totalmente abraçada, abandona-se a idéia de que as crianças devem se tornar ‘normais’ para contribuir para o mundo”. Diante disso, é imprescindível diferenciar a integração da inclusão, na qual na primeira, tudo depende do aluno e ele é que tem que se adaptar, buscando alternativas para se integrar, ao passo que na inclusão, o caminho é inverso, ou seja, o social deverá modificar-se e preparar-se para receber o aluno com deficiência.
A inclusão também passa por mudanças na constituição psíquica do homem, para o entendimento do que é a diversidade humana. Também é necessário considerar a forma como nossa sociedade está organizada, onde o acesso aos serviços é sempre dificultado pelos mais variados motivos. Jamais haverá inclusão se a sociedade se sentir no direito de escolher quais os deficientes poderão ser incluídos. É preciso que as pessoas falem por si mesmas, pois sabem do que precisam, de suas expectativas e dificuldades como qualquer cidadão. Mas não basta ouvi-los, é necessário propor e desenvolver ações que venham modificar e orientar as formas de se pensar na própria inclusão.
Desta forma, a  Declaração de Madrid (2002), define o parâmetro conceitual para a construção de uma sociedade inclusiva, focalizando os direitos das pessoas com deficiências, as medidas legais, a vida independente, entre outros: ”O que for feito hoje em nome da questão da deficiência terá significado para todos no mundo de amanhã”.O marco histórico da inclusão foi em junho de 1994, com a Declaração da Salamanca Espanha, realizado pela UNESCO na Conferência Mundial Sobre Necessidades Educativas Especiais: Acesso e Qualidade , assinado por 92 países, que tem como princípio fundamental: "todos os alunos devem aprender juntos, sempre que possível, independente das dificuldades e diferenças que apresentem".
Além disso, o Brasil é Signatário de documentos internacionais que definem a inserção incondicional de pessoas com deficiência na sociedade - a chamada inclusão. Muito mais do que uma idéia defendida com entusiasmo por profissionais de diversas áreas desde 1990 a construção de sociedades inclusivas, nos mais diferentes pontos do planeta, é meta do que se poderia chamar de movimento pelos "direitos humanos de todos os humanos". No dia 14 de dezembro foi assinada a resolução 45/ 91da ONU, que solicitou ao mundo "uma mudança no foco do programa das nações unidas sobre deficiência passando da conscientização para a ação, com o compromisso de se concluir com êxito uma sociedade global para todos por volta de 2010". No Brasil, a Lei de Diretrizes e Bases em 1996, refere-se sobre estar "preferencialmente" incluída, mas também haverá quando necessários serviços de apoio especializado na escola regular para atender as peculiaridades e que o atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que em função das condições específicas do aluno não for possível sua integração nas classes comuns do ensino regular.
Com a Resolução n.2/2001 que instituiu as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, houve um avanço na perspectiva da universalização e atenção à diversidade, na educação brasileira,com a seguinte recomendação: Os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos,cabendo às escolas organizar-se para o atendimento aos educandos com necessidades educacionais especiais (NEE), assegurando as condições necessárias para a educação de qualidade para todos. No entanto a realidade desse processo INCLUSIVO é bem diferente do que se propõe na legislação e requer muitas discussões relativas ao tema.
Já no Japão, em 2002, foi aprovada a declaração de Sopporo representado por 109 países, por ocasião da VI assembléia mundial da Disabled Peoples International-DPI, onde fala sobre a educação inclusiva: "a participação plena começa desde a infância nas salas de aulas, nas áreas de recreio e em programas e serviços. Quando crianças com deficiência se sentam lado a lado com muitas outras crianças, as nossas comunidades são enriquecidas com a aceitação de todas as crianças. Devemos instar os governos em todo mundo a erradicarem a educação segregada e estabelecer uma política de educação inclusiva".
A REALIDADE:
Infelizmente, às vezes, deparam-nos com a resistência dos professores e diretores, manifestas através de questionamentos e queixas ou até mesmo com expectativas de que se possa realizar ou apresentar soluções mágicas, com aplicação imediata, o que de certa forma causa certa decepção e frustração, pois  não existe esse tipo de milagre! O problema acaba se agravando, quando percebe-se que alguns  professores ficam  totalmente dependente de apoio ou assessoria de profissionais da área da saúde. Nesse caso a questão clínica parece sobressair e novamente o pedagógico fica esquecido, isto é, à mercê de um tratamento clínico. Com isso, o professor pode sentir-se  desvalorizado e fora do processo por considerar esse aluno como doente, considerando-se impotente, uma vez que ele precisa de tratamento especializado de clínica (psicopedagógica, psicológica, fonoaudiológica dentre outros especialistas). Sendo assim, parece que o professor acaba se esquecendo do seu papel, porém não pensa-se em como foi  sua formação, as condições da escola em que trabalha e recebe esses alunos, que acabam entrando e continuam excluídos de todo o processo de ensino-aprendizagem e social, causando frustração e fracassos, dificultando ainda mais a proposta de inclusão.
Por um lado os professores julgam-se incapazes de dar conta dessa demanda, achando-se despreparados e impotentes frente a essa realidade que é agravada pela falta de material adequado, de apoio administrativo e recursos financeiros. Além disso observa-se com freqüência, a dificuldade dos professores, a partir de algumas falas carregadas de preconceitos e estigmas, frustrações e medo: "não sou capaz disso", "não sei por onde começar", "é preciso ter uma equipe técnica na escola", "a direção não entende", "vai prejudicar os outros alunos", "não vou beneficiar o aluno com deficiência", "a criança com deficiência sofre rejeição dos outros alunos", "preciso de assessoramento em sala de aula, tanto para os com deficiência quanto para os de altas habilidades", ficamos angustiados e sem ação frente a esse aluno" , "precisamos de pessoal qualificado que nos ajude a amenizar a angústia que temos ao trabalhar com eles", "o professor encontra-se perdido quanto à inclusão", "alunos e professores despreparados para aceitá-los", "imposto pelo MEC as escolas tem que recebê-los", "qual as metodologias mais rápidas, eficientes e adequadas ao nosso aluno? "," necessitamos treinamento específico", "não somos preparados para atuar em todas as áreas", "como alfabetizar o deficiente? ", " como realizar prova diferente para o aluno especial? ", que atitude tomar com a criança hiperativa se os outros alunos não aceitam o diferente? ", "o professor encontra-se perdido diante o aluno portador de necessidades especiais", "como trabalhar esse aluno na parte psicológica? ", "os professores são despreparados para atender melhor o aluno especial"...
Para Figueira, (1995,) "palavras são expressões verbais de imagens construídas pela mente. Às vezes, o uso de certos termos, muito difundido e aparentemente inocentes, reforça preconceitos. Além dessas falas, temos observado, o medo da mudança com a certeza do fracasso e medo da diferença onde se sentem ameaçados, os que provocam afastamento, o estigma e conseqüentemente o preconceito. O professor desconhece quem é este sujeito, suas possibilidades, seu desejos, suas dificuldades e limitações". Devemos considerar também os conflitos que se estabelecem nas relações­ frente às questões relativas à gratificação no plano salarial e o aumento no trabalho para os professores do ensino regular. Aliado a esse contexto escolar, encontramos ainda a dificuldade do ponto de vista econômico, principalmente nos pequenos municípios, que analisam o custo ­benefício da acessibilidade, ou seja, em  como adaptar os ônibus, com custo elevado para o número considerado insignificante de pessoas com deficiência. Por trás disso, sabe-se que ainda existe a idéia, que as pessoas com deficiência são improdutivas e por isso, pouco deve ser investido. Contudo, esse posicionamento dificulta a entrada na escola e no trabalho, acentuando, cada vez mais  a sua condição de desvantagem social ou de desfavorecimento em relação a outras pessoas.
Segundo à Organização das Nações Unidas  (ONU), alguns fatores ainda interferem na inclusão, tais como: ignorância negligencia e superstição e o medo .Estes fatores são mantidos certamente pela desinformação a respeito das deficiências e inclusão.Em reunião técnica com os procuradores da república e promotores de justiça promovida pela CORDE e Departamento dos direitos humanos (Ministério da Justiça) e Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (Ministério Publico Federal), que destacaram, como dificuldades para o acesso ao sistema de ensino: as barreiras arquitetônicas, a deficiente qualificação do profissional da rede de ensino, a resistência do sistema educacional em receber alunos com deficiência em seus estabelecimentos de ensino, a inexistência de material adequado para o atendimento do aluno, o numero excessivo de alunos na sala de aula, dificultando o acesso e permanência com qualidade do aluno com deficiência, a insuficiência de transporte publico adequado até o estabelecimento de ensino e inexistência de dados que identifique a demanda não atendida pelo sistema de ensino.Com a Declaração de Quito em 11 de abril de 2003, os governos da América Latina defendem uma Convenção Internacional para a proteção e promoção dos direitos e dignidade da ONU.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante de todas essas mudanças, que são fundamentais para inclusão,  percebe-se que ainda exige-se esforço de todos, para que haja a possibilidade  da escola ser vista como um ambiente de construção de conhecimento, deixando de existir a discriminação de idade e capacidade. Para isso, a educação deverá ter um caráter amplo e complexo, favorecendo a construção ao longo da vida, e todo aluno, independente das dificuldades, poderá beneficiar-se dos programas educacionais, desde que sejam dadas as oportunidades adequadas para o desenvolvimento de suas potencialidades. Entretanto, isso exige do professor uma mudança de postura, além da redefinição de papeis que possa assim favorecer o processo de inclusão. Desta forma, para que a inclusão seja uma realidade, será necessário rever uma série de barreiras, além da política e das práticas pedagógicas, devem ser revistos os processos de avaliação utilizados após a inclusão. É necessário conhecer o desenvolvimento humano e suas relações com o processo de ensino aprendizagem, levando em conta como se dá este processo para cada aluno. Portanto, deve-se utilizar novas tecnologias e Investir em capacitação, atualização, sensibilização, envolvendo toda comunidade escolar. Focar na formação profissional do professor, que é relevante para aprofundar as discussões teóricas práticas, proporcionando subsídios com vistas à melhoria do processo ensino aprendizagem. Assessorar o professor para resolução de problemas no cotidiano na sala de aula, criando alternativas que possam beneficiar todos os alunos. Utilizar currículos e metodologias flexíveis, levando em conta a singularidade de cada aluno, respeitando seus interesses, suas idéias e desafios para novas situações. Investir na proposta de diversificação de conteúdos e práticas que possam melhorar as relações entre professor e alunos. Avaliar de forma continuada e permanente, dando ênfase na qualidade do conhecimento e não na quantidade, oportunizando a criatividade, a cooperação e a participação. Valorização maior das metas e não dos obstáculos encontrados pelo caminho, priorizando as questões pedagógicas e não apenas a questão biológica, com expectativa de que tudo será resolvido pela saúde. Não existe aqui nenhuma proposta de inclusão que possa ser generalizada ou multiplicada, pois ainda é incipiente, no entanto é de consenso que esse processo é de responsabilidade de toda a sociedade e por tanto é preciso que a escola esteja aberta para a "escuta", favorecendo assim, as trocas para a construção do processo de inclusão escolar.  Considera-se que para o processo de inclusão escolar seja imprescindível  uma transformação no sistema de ensino, que venha beneficiar toda e qualquer pessoa, levando em conta a especificidade do sujeito e não mais as suas deficiências e limitações. Somente assim, isto é, com o olhar voltado para as capacidades do sujeito, quem sabe o processo de inclusão possa vir a ser a REALIDADE que tanto esperamos e da qual tanto a EDUCAÇÃO precisaria, para de fato ser SIGNIFICATIVA, DEMOCRÁTICA  E SOBRETUDO JUSTA, cumprindo apenas o que lhe é atribuído como missão: ‘ garantir ACESSO, PERMANÊNCIA , mas sobretudo, RESPEITAR o tempo de cada um, GARANTINDO A APRENDIZAGEM de TODOS.
Referências:
MEC - Ministério de Educação - Secretaria de Educação Especial ­POlÍTICA NACIONAl DE EDUCAÇÃO ESPECIAL, Brasília MEC - SEEDSP 1994.
Montoam, Maria Tereza Eglér e colaboradores, INTEGRAÇÃO DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA - editora Memnon edições científicas Itda, 1997.
Ministério da Justiça - DECLARAÇÃO DE SALAMANCA E LINHA DE AÇÃO SOBRE NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS - Brasília, corde, 1997.
Congresso Nacional - lei de Diretíizes e Bases da Educação Nacional, 1996.
Congresso Nacional - Constituição da República Federativa do Brasil ­Brasília - Senado Federal, 1988.
Conselho Nacional de Educação - Câmara de Educação Básica ­Resolução CNE/CNB n.2 de 11 de setembro de 2001 - Brasília.
Figueira, E. A Imagem do Portador de Deficiência Mental na Sociedade e nos Meios de Comunicação - Ministério da Educação - Secretaria de Educação Especial.
YUS, Rafael - Educação Especial Uma Educação Holística para o séc XXI, Tradução. Daisy Vaz de Moraes - Porto Alegre, ARTIMED, 2002.
Poso, Juan Ignácio - Aprendizes e mestres: a nova cultura da aprendizagem Juan Ignácio Pozo; trad. Emani Rosa - Porto Alegre: Artmed 2002.




sábado, 23 de abril de 2011

Uma reflexão para a prática educativa em Paulo Freire


Antes de anunciar a presença de Paulo Freire como educador faz-se necessário contextualizá-lo como homem. Diga-se um “percebedor” da realidade por sua condição de pobre, nordestino e brasileiro. Sua luta e presença baseiam-se na categoria “opressão”, principalmente, por ter sido um homem que fez uma leitura concreta do mundo do oprimido, da complexidade da relação oprimido e  opressor, para, finalmente, propor uma pedagogia libertadora que consiste em uma educação voltada para a conscientização da opressão (pedagogia do oprimido) e a conseqüente ação transformadora.



Segundo Andreolla (1997), a categoria “opressão” em Paulo Freire assume dimensões várias. A saber, na dimensão antropológica, mata a cultura do homem, o seu saber enquanto homem (nas palavras de Boaventura Santos, um “epistemicídio”: matar o conhecimento do outro); na dimensão psicológica derruba com o “ser”, o “eu” do homem, permitindo como conseqüência sua coisificação e ou despersonalização; na dimensão ontológica está paralelo à desumanização, enquanto “ser homem” (processo de hominização x cultura necrófila); na dimensão econômica,  a opressão permite que ricos estejam cada vez mais ricos e pobres cada vez mais pobres. A ideologia do “ter mais” se concretiza na relação dominador e dominado;  na dimensão política há desenfreadamente a ação do poder central sobre a periferia, isto é, ou são leis que beneficiam e privilegiam alguns, ou são “Medidas provisórias” que retratam um poder autoritário que é cego às necessidades e prioridades de uma grande maioria; e por último a dimensão pedagógica cujo caráter de opressão se estabelece na forma de leis que na prática retrocedem às conquistas e desejos de toda comunidade educativa e também na forma de relação professor e aluno e todas as nuances do sistema de ensino (currículo, prática pedagógica e avaliação). Nestas dimensões a obra, e a vida de Paulo Freire dão uma resposta, apontando caminhos: Ao tratar da pedagogia da “consciência” pretendeu elucidar do educando sua criticidade, criatividade e ação diante do que está dado: é preciso que o oprimido tenha consciência de sua opressão (pedagogia do oprimido). Ao tratar da pedagogia da “pergunta” ele torna-se um sociólogo da sala de aula e reflete a relação professor e aluno enquanto concepção bancária x concepção libertadora, onde o primeiro (como num banco) deposita conhecimentos através da transmissão apenas no segundo e, este o armazena e devolve na prova final.
“O educador faz “depósitos” de conteúdos que devem ser arquivados pelos educandos. Desta maneira a educação se torna um ato de depositar, em que os educandos são os depositários e o educador o depositante. O educador será tanto melhor educador quanto mais conseguir “depositar” nos educandos. Os educandos,  por sua vez, serão tanto melhores educados, quanto mais conseguirem arquivar os depósitos feitos. (Freire, 1983:66)”
Prova, tão logo, que através da “problematização” da realidade, da significação é possível desenvolver uma concepção libertadora na relação professor e aluno e conhecimento e aprendizagem.
“Como situação gnosiológica, em que o objeto cognoscível, em lugar de ser o término do ato cognoscente de um sujeito, é mediatizador de sujeitos cognoscentes, educador, de um lado, educandos, de outro, a educação problematizadora coloca, desde logo, a exigência da superação da contradição educador  x educando. Sem esta, não é possível a relação dialógica, indispensável à cognoscibilidade dos sujeitos cognoscentes, em torno do mesmo objeto cognoscível.” (Freire, 1983:78)
 Entre educador e educandos não há mais uma relação de verticalidade, em que um é o sujeito e o outro objeto. Agora a pedagogia é dialógica, pois ambos são sujeitos do ato cognoscente. É o “aprender ensinando e o ensinar aprendendo”. O diálogo, em Freire, exige um pensar verdadeiro, um pensar crítico. Este não dicotomiza homens e mundo, mas os vê em contínua interação. Como seres inacabados, os homens se fazem e refazem na interação com mundo, objeto de sua práxis transformadora. (Boufleuer, 1991) A prática pedagógica passa a ser uma ação política de troca de concretudes e de transformação.
O que Paulo Freire nos ensina hoje é colocar em prática uma lição que sabemos de cor. Afinal, os cursos de formação de professores tomam conhecimento de sua proposta. Vários estudos e publicações têm mostrado que a proposta de Paulo Freire perpassa tanto o ensino formal como o informal.
Nas análises de currículo, prática pedagógica e avaliação, em nossas escolas, percebe-se uma aplicabilidade de sua proposta. Ou seja, quando analisamos sobre os conteúdos  serem interdisciplinares (politécnicos), fragmentários; quando abordamos a necessidade de união entre teoria e prática enquanto metodologia; e, ainda a democracia enquanto gestão, nós nos damos conta da pedagogia problematizadora de Paulo Freire.
A lição maior como educadores que temos de Freire é a preocupação com o social. A busca de alternativas e propostas devem ser uma constante em nosso dia a dia, no sentido de resgatar o “homem”, o “cidadão” e o “trabalhador” da alienação de seu “ser”, de seu exercício de cidadania e de sua dignidade.
Ainda, como homem de seu tempo, devemos aprender de Freire, a ter presente o nosso tempo sem alienação do real. As proposta pedagógicas devem ser alternativas de “hominização” em contraposição ao processo de relações econômicas, que se definem em alienação do homem e expropriação de seu saber. Segundo Marx (1968), em O Capital, com a venda da força de trabalho, o trabalhador é considerado igual a uma mercadoria, é coisificado na relação de produção, é “apropriado” pelo capital. As relações de produção passam pelos critérios  do capital e não pelos critérios da humanidade. A mercadoria encobre as características sociais do próprio trabalho dos homens. Fernandes explica assim este fetichismo da mercadoria:
“(...)...quanto mais o trabalhador se apropria do mundo exterior, da natureza sensorial, através do seu trabalho, tanto mais ele se priva de meios de vida segundo um duplo aspecto; primeiro que cada vez mais o mundo exterior sensorial cessa de ser um objeto pertencente ao seu trabalho, um meio de vida do seu trabalho; segundo, que cada vez mais cessa de ser meio de vida no sentido imediato, meio para  a subsistência física do trabalhador. (...) apenas como sujeito físico ele é trabalhador.” (Fernandes, 1989)
Finalizando, as categorias diálogo, oprimido, problematização, conscientização, libertação definem o homem político em Paulo Freire. Ou seja:
  1. Sua proposta vai além das críticas das formas educativas atuais, porque define-se em uma pedagogia da consciência: consciência crítica enquanto conhecimento e práxis de classe.
  2. Na escola formal, a pedagogia de Paulo Freire requer um professor problematizador da realidade, pois trata-se da pedagogia da pergunta que requer diretividade.
  3. Através de uma relação dialógica e dialética entre professor e aluno, a proposta pedagógica de Freire, centraliza-se na dimensão do conhecimento, no sentimento de aceitação do outro, da interação, da intersubjetividade.
  4. A revolução necessária para a transformação social que não considera o amor, apenas substituirá o opressor – o oprimido passa a ser o opressor – que continuará a mesma lógica da dominação.
  5. A revolução deve ser entendida como um processo, uma mudança democrática e não apenas como uma ruptura. A revolução é um processo político pedagógico de transformação, que requer reconstrução do poder em novas formas de relação. “A revolução que deve ocorrer é uma grande ação cultural para a liberdade, realizada pelo povo (Freire, 1977).”
  6. A pedagogia do oprimido tem por base o diálogo, necessidade ontológica do ser humano.
  7. Ser utópico, também, é uma exigência ontológica do ser humano, uma exigência histórica.
Esta foi sua luta e, é esta a sua lição.

Docente da Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC – Ilhéus, BA - Publicado na Revista Espaço Acadêmico Número 45.